Transparência e sustentabilidade no agronegócio

O descontentamento e a falta de clareza no financiamento do agronegócio através de instrumentos como Fiagro e CRAs têm gerado desconforto entre os investidores.

“Com todo respeito, se eu fosse cotista, me sentiria insultado. Fazem esses vídeos e continuam sem apresentar os devedores no relatório gerencial? Isso pra mim não é transparência, é marketing”, desabafa um investidor num fórum de mensagens no Telegram. O debate cresce sobre a falta de informações claras.

O investidor se refere especificamente ao RURA11, um Fundo de Investimento das Cadeias Produtivas Agroindustriais (Fiagro) gerido pelo Itaú Asset Management. A ausência de dados detalhados preocupa quem aplica valores nesses produtos.

Por que o Fiagro ainda não cobre a transparência necessária?

O Fiagro é um dos mais recentes instrumentos privados para financiar o agronegócio. Além dos Fiagros, existem os Certificados de Recebíveis do Agronegócio (CRAs), as Letras de Crédito do Agronegócio (LCAs), os Certificados de Direitos Creditórios do Agronegócio (CDCA) e as Cédulas de Produto Rural (CPRs). Juntos, esses instrumentos ultrapassaram, pela primeira vez, o volume de R$ 1 trilhão em abril de 2023. Porém, a transparência nesse processo é questionável.

Quais são os desafios na fiscalização desses fundos de investimento?

Desde 2021, o Banco Central do Brasil exige que instituições financeiras publiquem uma Política de Responsabilidade Social, Ambiental e Climática (PRSAC). Também passaram a ser impostas regras para impedir que negócios com risco climático tenham acesso ao crédito público. No entanto, essas normas não se aplicam aos instrumentos que financiam o agronegócio na B3, a Bolsa de Valores do Brasil, regulada pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM).

Ainda em 2023, o Manual de Crédito Rural (MCR) foi atualizado para excluir invasores de terras indígenas e áreas embargadas pelo Ibama. No entanto, tais medidas não abrangem o mercado de capitais, gerido pela CVM.

Violação de direitos e impacto ambiental: Onde entra o financiamento?

O agronegócio no Brasil enfrenta críticas devido ao apoio financeiro a empresas com histórico de violações socioambientais. Um exemplo é a Brasil Biofuels (BBF), maior produtora de óleo de palma da América Latina. Apesar das denúncias, a empresa conseguiu emitir debêntures somando R$ 133 milhões, além de tomar um CRA de R$ 55 milhões, absorvido pelo Fiagro VCRA11.

Outro caso é o da JBS, que recebeu cerca de R$ 11,6 bilhões via CRAs, apesar de seu envolvimento em desmatamento e aquisição de gado de áreas protegidas. O Fiagro CRAA11 e o BBGO11, do Banco do Brasil, investiram na empresa, atraindo milhares de cotistas até agosto de 2024.

Como os investidores opinam sobre a falta de clareza?

Investidores que utilizam esses fundos frequentemente reclamam da falta de transparência. Conforme relatado, muitos não encontram informações precisas sobre os devedores e a destinação dos recursos investidos. Os relatórios apresentados são muitas vezes genéricos, mencionando apenas categorias amplas como “Frigoríficos” ou “Grãos e Pecuária”.

Quais as exigências para maior transparência e regulamentação robusta?

Organizações da sociedade civil recomendam a geolocalização das atividades financiadas e a inclusão de dados como licenças ambientais e estudos de impacto climático nos relatórios dos fundos. A CVM é chamada a adotar regras mais rígidas quanto à fiscalização dos fundos Fiagro e CRAs. A proposta é garantir que os recursos não financiem atividades ilegais ou que causem danos ambientais.

A falta de regras ambientais e climáticas adequadas para os instrumentos de dívida privada do agronegócio levanta uma preocupação significativa. A inclusão de uma verificação mais detalhada e a regulamentação mais robusta são vistas como essenciais para evitar o financiamento de práticas prejudiciais ao meio ambiente e à sociedade.

Conclusão: Ações necessárias para um futuro mais transparente e sustentável

Para Tarcísio Feitosa da Silva, da Florest and Finance, há uma omissão clara na ausência de regulamentações claras que protejam o meio ambiente e as comunidades vulneráveis. A sustentabilidade deve ser um pilar fundamental, garantindo que o investimento no agro seja seguro e responsável, não colocando em risco o meio ambiente nem as populações locais.

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